terça-feira, 19 de junho de 2012

Medidas novas



Medidas novas[1]

            Ainda estou ouvindo um prelado que me dizia, quando da facultação de missas vespertinas: “Em minha diocese, não permitirei sejam rezadas missas vespertinas. Não vejo vantagem nisso” Era a repulsa natural de um conservador arraigado a qualquer novidade. Com o correr dos dias, vencido pela medida nova, permitiu missas vespertinas em sua própria catedral.
            Veio, depois, o caso das missas parcialmente recitadas em vernáculo, e o costume de celebrar o sacerdote virado para o povo, à semelhança do que ocorre nos cultos promovidos por nossos irmãos separados. (Não vejo inconveniência em adotarmos o que eles têm de bom). O Hábito de dialogar a missa, ao invés do que até então era praxe: cada um entregar-se às suas devoções particulares, num sentido individualista. É bem verdade que o “coroinha” encarnava a assembléia eclesial, unindo a todos em sua humilde pessoa, representando-os.
Veio o costume de comungarem os fiéis, de pé, ante ao altar (não deve ser esquecida a genuflexão ao aproximar-se o comungante), prescindindo da velha mesa de comunhão, tão desconforme com a mesa do cenáculo usada por Cristo e seus comensais.  
Veio o costume de rezar-se o próprio Cânon da missa em voz audível quando há tantos séculos o era submissa voce.  Outras inovações vão se consubstanciando, com proveito real ou sem proveito prático.
O texto latino, cedendo lugar ao texto vernáculo, trouxe melhor entendimento da ação litúrgica aos fiéis atrasadíssimos e pouco interessados em coisas da religião. As imagens, algumas tão lindas e artísticas, vão sendo retiradas de altares e nichos com discrição e cuidado, parecendo um esforço de remover de entre cristãos alguns obstáculos  que os têm mantendo ainda afastados uns dos outros, - católicos e evangélicos – quando somos todos irmãos. Algumas igrejas e capelas, efetivamente, tinham em seus altares uma pletora de imagens...
O próprio altar-mor das catedrais, caído em desuso, vais sendo demolido para dar lugar ao trono do Ordinário, que fica melhor instalado face a face com o rebanho de quem é modelo a ser imitado. Com isso talvez o velho faldistório venha a ser esquecido.
As casulas romanas, comuns ainda há vinte anos, cederam sua vez às casulas góticas, tão ao gosto atual. Reconheçamos que o gótico é mais solene. Alfaias e vasos litúrgicos vão tomando feição antiga. Não apenas o altar do sacrifício. Ritos antigos vão sendo restaurados em sua primeva simplicidade.
Medida novíssima, e do melhor bom-senso, é a que está exigindo de bispos e párocos setuagenários deixem de mãos mais firmes o governo das dioceses e freguesias, pela renúncia voluntária dos velhos ocupantes. As múltiplas atividades hodiernas dos pastores trazem essa conseqüência que tem sentido de justiça. O homem que deu de si tudo o que nele havia, durante quarenta longos anos, e bem vividos, é natural que tenha seu merecido repouso remunerado. Mas esse repouso não é inatividade absoluta, senão muito relativa. Ajudaria, na medida do possível, seu substituto. É indiscutível que um pastor jovem, cheio de vigor, seja mais eficiente no apascento e guarda da grei. De antemão se sabe que haverá homens apegados demasiadamente ao múnus pastoral e – por que não dizê-lo? – às prerrogativas do seu sagrado ofício que, sem grandes constrangimentos, não hão de entregar as rédeas do governo, malgrado sua debilidade, canseira e outros impedimentos que doenças graves lhes acarretem. Mas, com sinceridade, que pode fazer um octogenário, um nonagenário, senão impedir a marcha do rebanho ou atrapalhar seu bom andamento? Esta não deixa de ser uma das melhores inovações pós-conciliares. Para os que se não querem sujeitar a ela, há o recurso de um rescrito que conceda a um auxiliar ou coadjutor o governo sede plena[2].
E a vida continua...


[1] Publicado em Lume de Palha e Áscuas, 1969
[2] Significa que o novo pároco tem a seu cargo toda a gestão da vida da Diocese, por incumbência da Santa Sé, sem que se encontre vaga a sede episcopal.

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